sexta-feira, 16 de julho de 2010

46º Sinal | Pequenas coisas


Hoje o dia teve trinta km intensos debaixo de neblina, e depois horas de chuva de caminhada. Era previsível, estamos na Galiza e à semelhança do Minho chover não é novidade. Não ficámos no ponto normal de etapa mas sim uns 10 km ou um pouco mais à frente na aldeia de Samos com o seu imponente mosteiro. Hoje foi um dia especial mas muito simples, tão simples que vou ser breve. Coisa simples número um: a paisagem verdejante. Número dois: uma troca de gritos de Tarzan com um pai e as suas filhas de uns nove e seis anos, fizemo-lo por uns bons dois ou três km. Foi bom sentir o ânimo das crianças a puxarem por mim. Já dizia a minha mãe que o melhor do mundo são as crianças, eu acrescento, as pessoas. Este talvez tenha sido o momento mais alto do meu dia, sem contar com os mil e trezentos e tal metros da subida ao Alto do Poio. Mas foi o mais alto porque me senti útil em ajudar os pais a manterem a moral das filhas em alta.
Número três: Ter descoberto que um dos monges beneditinos que desenvolveu estudos importantes na teologia era um tal de Doctor Bernardus. Esta descoberta deve-se à ida a missa do peregrino. E quando olhei para a cúpula, lá estava ele representado.
Número quatro: partilhei com o Martin, um alemão que conheci hoje, como tirar melhor partido da sua máquina fotográfica. E como poderia fazer o caminho até Finisterra, uma vez que eu já o tinha feito o ano passado.
Assim se faz caminho e se enche uma vida que é bela de mochila às costas.

45º Sinal | O renascer




A expectativa para hoje era grande, muito de tanto se ouvir falar da famosa subida até Ocebreiro. Começámos cedo, na habitual hora do costume, seis da manhã. Fazia frio, mas antes assim. A passo lento sem forçar fomos andando. Até um pouco antes de La Faba foi pacífico, depois começou a dura subida, mas não é assim tão má. A dada altura da subida, o espírito do caminho, de abertura aos outros reapareceu quando ao cruzar-me com duas peregrinas americanas, mãe e filha, surgiu uma conversa e um à vontade que só seria espectável com alguém que já viesse a fazer caminho de longe, o que era o caso, tinham começado no mesmo local que eu e iriam acabar um dia depois de mim. Foi com a filha que segui caminho até ao topo, com conversas sobre culturas, caminhos e vidas. Esta conversa distraiu-me tanto que nem dei pela dificuldade do caminho. Ao chegar ao cimo estava um italiano a dar força com som de um corno e a distribuir mensagens de paz e outras coisas de boa energia, assim como dava ramos de flores às mulheres e raparigas. Era tal a boa energia do senhor que lhe pedi um abraço. Foram estas duas pequenas coisas que tornaram o meu dia diferente e que me fizeram ter esperança que ao virar da esquina podemos ter uma boa surpresa. O resto do dia foi pacífico, entre passeios na aldeia e descanso. Deu ainda para fazer a boa acção do dia em que ofereci um guia que tinha comprado em Saint Jean a duas peregrinas que andavam desorientadas. Assim se faz caminho e se embeleza uma vida de mochila às costas, fiquei um pouco mais rico hoje.